CESE leva apoio emergencial a povos tradicionais e comunidades locais afetadas por enchentes no Acre

 Casas, plantações e criações de animais inteiras foram destruídas; apoio emergencial chegará a aproximadamente 3000 indígenas e população em geral

O ano de 2021 começou de forma dura para o povo do Acre. O estado já vinha enfrentando, ao mesmo tempo, a pandemia de Covid-19 e um surto de dengue, quando, em meados de fevereiro, os acreanos se viram diante de grandes enchentes que afetaram mais de 130 mil pessoas – muitas foram desalojadas ou mesmo desabrigadas.  No meio desse cenário caótico, estão também os povos indígenas, que já sofriam perdas de direitos antes da pandemia.

Por conta das cheias, houve deslizamentos de terra em aldeias, casas foram dizimadas, plantações inteiras e criações de animais destruídas, pontes levadas pela água – dificultando o acesso a áreas específicas -, povos de uma mesma comunidade afastados uns dos outros, quando colocados em abrigos improvisados por governos locais.

Diante da insuficiência ou mesmo da falta de auxílio dos governantes das esferas municipal, estadual e federal, movimentos populares recorreram ao apoio da CESE. Até o momento, a Coordenadoria Ecumênica de Serviço já enviou cerca de 160 mil reais a essas organizações, em caráter emergencial. Outros 40 mil também já estão garantidos e serão enviados ainda em março.

Vanessa Pugliese, Assessora de Projetos e Formação da CESE, pontua que a situação de gravidade vivenciada no Acre é ampliada pelo enfrentamento de vários problemas simultaneamente – pandemia de Covid-19, o surto de dengue e pelo contexto sociopolítico e econômico atual do país.

“A CESE se solidariza com as populações atingidas e está destinando parte de seu recurso para apoio emergencial, especialmente para garantia de segurança alimentar. Nossa expectativa é de aporte de 400 mil reais em projetos que envolvem populações vulnerabilizadas como povos indígenas, ribeirinhos/as, mulheres do campo e da cidade, populações urbanas da periferia, dentre outras”, complementa.

Foto: CPT Acre

Aproximadamente 3000 pessoas de diferentes povos indígenas – Madja, Shanenawa, Apurinã, Jamamadi, Jamináwa, entre outros – e de populações em geral serão beneficiadas diretamente por esse apoio emergencial já efetuado. A verba tem por objetivo custear a aquisição de cestas básicas, materiais de higiene, limpeza, de saúde, ferramentas para trabalho agrícola, combustível, entre outros itens.

Outros projetos estão em análise. Até o momento, são sete organizações beneficiárias: ASPAKNO – Associação de Seringueiros, Produtores e Artesãos Kaxinawá de Nova Olinda; SHANEKAYA – Associação dos Povos Indígenas Shanenawa da Aldeia Shane Kaya; Cimi-AO – Conselho Indigenista Missionário – Regional Amazônia Ocidental; CPI-AC- Comissão Pró-Índio do Acre; CPT-ACRE – Comissão Pastoral da Terra; IMA – Instituto Mulheres da Amazônia; e OPIAJBAM – Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Boca do Acre Amazonas – estas duas últimas ainda vão receber o recurso solicitado.

A maior parte delas tem sede nos municípios de Rio Branco e Feijó, onde estão cerca de 16,9 mil das mais de 130 mil pessoas atingidas pelas enchentes no estado. Mas suas ações estenderam o auxílio e solidariedade a comunidades de outras cidades. A Comissão Pastoral da Terra distribuiu cestas básicas para famílias de Rio Branco, Porto Walter, Marechal Thaumaturgo e Sena Madureira. Suas ações ainda vão alcançar também as cidades de Cruzeiro do Sul, Boca do Acre e Pauini – estas duas últimas, situadas na região sul do Amazonas.

Ao todo, a CPT-ACRE arrecadou 430 cestas básicas para serem distribuídas às famílias nessas cidades. Darlene Braga, Articuladora de Projetos da organização, conta que se deparou com muitas cenas difíceis e que ouviu de algumas pessoas que esse apoio foi o primeiro que receberam de qualquer instituição. “Ouvi de um senhor que ele ‘perdeu tudo do nada que tinha’. Nunca tivemos uma experiência dessa aqui na CPT, então esse suporte é fundamental para as pessoas poderem dar uma respirada. Alguns comemoram o fato de ter o que comer naquele dia”, desabafa.

Ela relata que as necessidades que nasceram nesse momento superam a missão pré-estabelecida da CPT, que é de lutar por terras. “Se eles não comerem agora, eu não sei se eles vão ter condições de lutar por terra lá na frente. Nesse momento, estamos fazendo o que é preciso”, pontua. A organização se articulou com várias outras frentes para auxiliar as famílias atingidas – Pastoral da Juventude, sindicatos, paróquias, entre outros.

A Aldeia Shane Kaya, situada em Feijó, foi atingida por deslizamentos de terra e foi isso que causou a destruição das casas de seis famílias locais – fato que Tânia Shanenawa, presidente da Associação dos Povos Indígenas Shanenawa da Aldeia Shane Kaya, receia que possa vir a se repetir em um futuro próximo.

Ela conta que há um igarapé próximo à comunidade. Ele enche e seca mais rápido do que os rios e provoca as erosões de terra nas proximidades – o que acaba causando os deslizamentos. “Nós observamos que essas erosões já estão chegando mais perto de outras famílias. Esperamos que não avancem”, afirma.

Tânia narra uma situação parecida com que a foi vivenciada pela CPT-ACRE: o apoio direto recebido pela CESE  foi o primeiro para muitos. “A gente ouviu informações de que chegaria ajuda do governo, mas, até agora, não chegou. A CESE foi a primeira e as famílias ficaram felizes de receber esse apoio”, destaca. A associação usou o recurso para distribuir cestas básicas a todas as famílias da comunidade e para custear a compra de materiais e mão de obra para reconstrução das moradias destruídas.

A iniciativa do CIMI-AO estendeu o apoio emergencial a povos indígenas situados na região de Sena Madureira, que teve 2,5 mil famílias desalojadas e outras 1465 desabrigadas em decorrência das cheias, e de Santa Rosa dos Purus, onde 1,9 mil pessoas foram afetadas. Sena Madureira foi uma das cidades mais afetadas pelas enchentes no Acre. Ao todo, mais de 27,6 mil pessoas foram atingidas no município.

Foto: CPT Acre

Rosenilda Nunes Padilha, membro da Coordenação Colegiada do Cimi-AO, relata que as enchentes pegaram todos de surpresa. “Fazia tempo que não havia cheias que devastassem os territórios assim, plantações. Alguns povos indígenas foram transferidos para a cidade, outros preferiram ficar em seus barcos, outros ficaram em terras de fazendeiros, por que são mais altas”, comenta.

O Conselho Indigenista Missionário prevê a arrecadação de 90 cestas básicas para doação às famílias atingidas. “Compramos sacos e caixas de alimentos e montamos nós mesmos as cestas. Entregamos aos indígenas que já voltaram para suas aldeias. Em alguns casos, fizemos a entrega às lideranças das comunidades e eles fizeram a distribuição”, pontua.

Todos os projetos apoiados nesta iniciativa tiveram caráter emergencial. Eles também têm em comum seus objetivos: a busca por dignidade, segurança alimentar e a retomada das atividades de desenvolvimento econômico sustentável dos povos indígenas.