Unindo fé, cultura e respeito o Tapiri Ecumênico e Inter-religioso chega no Amapá

Tapiri Ecumênico e Inter-religioso realiza intercâmbio entre diversas tradições religiosas e culturais, fortalecendo laços, promovendo a união e o respeito entre diferentes comunidades do Amapá.

O Tapiri Amapá, realizado pela CESE em Macapá de 09 a 11 de setembro, reuniu 32 participantes de 31 organizações e movimentos sociais. Entre os grupos representados estavam movimentos populares e comunidades tradicionais, como quilombolas, povos indígenas, comunidades de terreiro, trabalhadoras domésticas, juventude, movimento LGBTQIAPN+, e outros. A diversidade de participantes refletiu a rica pluralidade das lutas sociais na região.

A programação incluiu um diálogo ecumênico e inter-religioso em que foi pautado  como os fundamentalismos impactam a vida dos povos originários e comunidades tradicionais, a luta pelos direitos das mulheres, os direitos da população LGBTQIAPN+, além das juventudes e movimentos culturais do Amapá, a partir de uma abordagem inclusiva e representativa das diversas perspectivas dos presentes.

Cimone dos Santos dos Reis, da comunidade tradicional Mazagão Velho, cita que mesmo com os racismos sofridos devido à imposição de outras religiões, por igrejas, ela continua resistindo. Ressalta que, apesar dessa repressão, de serem chamados de “macumbeiros”, sua comunidade nunca deixou de praticar sua cultura: “Nós somos resistência, a gente se faz resistência. Apesar de todas as dificuldades que enfrentamos, conseguimos e continuamos a mostrar às pessoas o que fazemos. O que praticamos nos faz bem e não faz mal a ninguém”, afirma.

O contexto cultural e religioso do Amapá é verdadeiramente multifacetado. A diversidade de crenças e tradições no estado reflete um rico cenário de influências e práticas que moldam a identidade local. Com uma população que abrange desde católicos e protestantes até praticantes de religiões afro-brasileiras e tradições indígenas, o Amapá é um estado com uma grande pluralidade religiosa e cultural.

Joanne Costa, presidenta do Grupo das Homossexuais Thildes do Amapá (GHATA), observa que o Tapiri traz uma visão natural de respeito e bem querer por todas as religiões. Ela destaca que, em vez de criar divisões, as religiões podem trabalhar juntas para o bem comum, garantindo um espaço de acolhimento e respeito mútuo: “A gente leva a pauta da população LGBTQIAPN+, dentro de um evento que traz aquela sensação de pertencimento, de onde você não é discriminado, em que você é respeitado e acolhido” relata.

O Marabaixo, uma das expressões culturais mais emblemáticas do Amapá, exemplifica essa diversidade de maneira notável. Originário da comunidade afro-amapaense, essa tradição é mais do que uma simples manifestação artística; é um símbolo de resistência e resiliência cultural. A dança de roda, as cantigas e a percussão do Marabaixo não apenas preservam costumes ancestrais, mas também celebram a identidade e a história das comunidades afro-brasileiras da região.

“A resistência com o nosso povo de matriz africana é grande, nós não pedimos para vir pra cá, nos trouxeram! Foi através desses posicionamentos, dessas intolerâncias que me fizeram a resistência. Eu não falo por mim e nem por uma religião, eu falo pelos povos tradicionais de matriz africana”, relata mãe Carmem, coordenadora executiva do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos de Matriz Africana no Amapá (Fonsanpotma).

As questões religiosas, a exploração de petróleo e os impactos sobre as comunidades tradicionais são temas interligados que refletem a complexidade dos diálogos abordados no Tapiri Amapá. Durante as mesas, foi citado também a importância das políticas públicas, como fundamentais no enfrentamento ao racismo e a intolerância religiosa, pois promovem a igualdade e a inclusão, oferecem proteção legal e direitos humanos, fomentam a educação e a conscientização.

Unindo fé, cultura e respeito o Tapiri chega no Amapá

“Hoje se tem delegacias onde a gente pode se dirigir, fazer nossas denúncias contra o racismo, contra intolerância de toda e qualquer forma e a qualquer movimento e segmentos”. 

Mãe Carmem

Padre Paulo Roberto, representante do Museu Afro Amazônico Josefa Pereira Laú, reflete sobre a intolerância crescente e destaca que essa questão é muito mais do não aceitar a religião ou a sexualidade de outra pessoa. E expressa satisfação em participar de um evento que reúne “irmãs e irmãos” indígenas: “Um fundamentalismo que existe na Amazônia é por exemplo ignorar os povos indígenas que são os donos do Brasil” cita.

“Meu povo não é contra religiões, nós queremos respeito! Hoje os jovens não querem saber mais sobre nossa cultura, mas estamos tentando recuperar”, afirma Demétrio Amisipa Tiriyó, coordenador da região da TI parque do Tumucumaque lado Rio Parú D’Oeste e representante da Articulações dos povos e organizações indígenas Amapá e Norte do Pará (Apoianp).

Intercâmbio Cultural no Tapiri: Conectando Tradições e Construindo Pontes 

Além das atividades citadas acima durante os dias de Tapiri, aconteceu no dia 11, em conjunto com o projeto “Patak Maymu: Autonomia e participação das mulheres indígenas da Amazônia e do Cerrado na defesa de seus direitos”, uma visita ao quilombo do Ambé, com uma parada no Forte São José.

A comunidade do Ambé tem 214 anos, com 77 casas em todo o seu território e tem uma forte tradição em que é comemorada a festa de seu padroeiro, São Roque, no dia 16 de agosto. Foi reconhecida pela Fundação Cultural Palmares como “comunidade quilombola” em 2006. 

No Amapá, comunidades quilombolas enfrentam ameaças a seus territórios por especulação imobiliária, o que desorganiza sua estrutura social e limita o acesso a recursos essenciais. No quilombo do  Ambé, a situação é ainda mais agravada pela precariedade dos serviços locais, incluindo um posto de saúde sem equipamentos e medicamentos e uma escola de ensino fundamental que não está devidamente equipada para receber os estudantes. 

“Com 56 anos ter ido na comunidade, ouvir um de nossos anfitriões falar, ver pessoas conhecidas, foi maravilhoso. Esse encontro (Tapiri), foi de excelência, reunir todas as religiões me deixou muito feliz, enquanto mulher preta e filha de quilombo, foi ótimo essa vivência”, afirmou Raimunda Coutinho de Souza, do grupo de economia criativa solidária Mãos Unidas.  

Essa é uma iniciativa promovida pela CESE, com o apoio da Fundação Ford, que visa investigar os impactos dos fundamentalismos e racismos religiosos na vida dos povos e comunidades tradicionais da Amazônia brasileira.

Bianca Daébs, assessora de ecumenismo e diálogo inter-religioso da CESE ressalta: “O Tapiri Ecumênico e Inter-religioso do Amapá foi muito importante porque conseguimos mostrar de modo muito concreto que o respeito à diversidade religiosa é possível e desejável entre nós.  Se podemos dialogar respeitosamente, podemos nos unir contra as consequências violentas do encontro dos fundamentalismos políticos, religiosos e econômicos que buscam desmobilizar a luta por Direitos e enfraquecer a Democracia no Brasil.”

A ação, já realizada em estados como Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Amapá, busca entender como essas questões afetam essas comunidades específicas e promover a discussão e a conscientização sobre os desafios enfrentados. O Tapiri contribui para a criação de um espaço de diálogo e apoio, enfatizando a importância da diversidade e do respeito mútuo em uma região rica em culturas e tradições.

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