Audiência Pública debate conflito da água na região oeste da Bahia

Com o objetivo de promover a pacificação social e a melhor forma de solucionar o conflito envolvendo a gestão das águas na região Oeste da Bahia, foi realizada no dia 30 de maio uma Audiência Pública para tratar o processo movido pela Associação Ambientalista Corrente Verde contra a empresa Sudotex, no município de Correntina (BA).  O evento ocorreu por mais de oito horas, iniciando-se às 9h da manhã e perdurando até a noite, no edifício-sede do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), em Salvador.

A região do oeste baiano passa por conflitos desde a década de 1970, com o início da invasão dos territórios das comunidades tradicionais para a expansão agropecuária, e mais tarde, para agronegócio. Com o modelo de desenvolvimento já instalado na região, a água se tornou o bem mais cobiçado pelas transnacionais e empresas como a Sudotex, que com o discurso de gerar emprego para a população já matou o Rio Santo Antônio e pretende avançar cada vez mais sobre outros rios.

A ação civil pública pede o cancelamento imediato das outorgas, concedida pelo Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), dando plenos direitos e condições para perfurar em uma única propriedade (Fazenda Sudotex), 17 poços artesianos de alta vazão, para a construção de 10 piscinões. Essa água essa sairia do Aquífero Urucuia, traria impactos irreversíveis sobre o ambiente.

Associação Corrente Verde denuncia a consequência do modelo do agronegócio que desmata milhares de hectares do bioma Cerrado, secam rios e riachos, e derrama sangue de ambientalistas, trabalhadores e trabalhadoras do campo. Marcos Rogério dos Santos, presidente da associação, narrou sobre os processos de desmatamentos na região, fez um panorama histórico da luta do povo em defesa dos rios e rememorou sua infância quando utilizava as águas naturais para o lazer: “Os rios eram imensos, a gente tomava banho. Eu quero que meu filho e o filho de Seu Antônio [proprietário da Sudotex] tenham o mesmo direito que um dia eu tive. Porque sem água e sem Cerrado não há vida”.

A realização da Audiência Pública levou em consideração todos os atores sociais envolvidos no processo, sob a relatoria do Desembargador Mário Albiani Júnior. Além das partes interessadas, Órgãos da Administração Pública, pesquisadores técnicos e outros representantes da sociedade civil estiveram presentes.

As consequências ambientais e sociais da captação da água pelo empreendimento foram expostas pelo professor Iremar Barbosa de Araújo. Para ele, a responsabilidade pelo conflito é do agronegócio e da omissão do Estado, e exemplifica: “Ninguém aplica um abatedouro dentro de uma chocadeira, primeiro espera o pinto crescer. O mesmo ocorre com os rios, que precisam crescer em paz. Não se extrai água em mananciais e lençóis freáticos que estão secando.”, e completa: “Eu não sou contra produção de algodão da Sudotex, se não ninguém aqui estaria vestido. Sou contra ao modelo de devastação do agronegócio.”.

Luciana Khoury, promotora ambiental do Ministério Pública da Bahia chama atenção que os impactos ambientais não ocorrem de maneira igual  na disputa pelos recursos hídricos. Usuários agrícolas, pequenos/as produtores/as rurais, comunidades tradicionais ribeirinhas são invisibilizados/as e os/as mais afetados/as nesse conflito. “As decisões do Estado e as outorgas não são compartilhadas com a população. Há comunidades e vidas produtivas responsáveis pelo desenvolvimento do país. Essas comunidades estão pagando, inclusive, com sua integridade física.”.

O Ministério Público baiano se colou favorável a suspensão de novas autorgas  e a fiscalização das atividades produtivas. Atualmente não há limites para exploração dos recursos naturais e os critérios técnicos das concessões estão desatualizados. “Infelizmente o Brasil não está preparado para gestão das águas. Os empreendimentos precisam de limites, porque temos uma realidade histórica que clama por justiça.”, afirmou a promotora.