FNDC lança relatório sobre violações à liberdade de expressão

Na semana em que a campanha Calar Jamais! completa exatamente um ano de lançamento, o Fórum Nacional pela Democratização (FNDC) publica o balanço das violações à liberdade de expressão registradas ao longo desse período. O relatório “Calar Jamais! – Um ano de denúncias contra violações à liberdade de expressão”, disponível em versão digital, documenta cerca de 70 casos apurados, organizados em sete categorias: 1) Violações contra jornalistas, comunicadores sociais e meios de comunicação; 2) Censura a manifestações artísticas; 3) Cerceamento a servidores públicos; 4) Repressão a protestos, manifestações, movimentos sociais e organizações políticas; 5) Repressão e censura nas escolas; 6) Censura nas redes sociais; e 7) Desmonte da comunicação pública.

O conjunto das violações comprova que práticas de cerceamento à liberdade de expressão que, já ocorriam no Brasil – por exemplo, em episódios constantes de violência a comunicadores e repressão às rádios comunitárias –, encontraram um ambiente propício para se multiplicar após a chegada de Michel Temer ao poder, por meio de um golpe parlamentar-jurídico-midiático, que resultou na multiplicação de protestos contra as medidas adotadas pelo governo federal e pelo Congresso Nacional.

São histórias de repressão que se capilarizaram em todas as regiões, em cidades grandes e pequenas, praticados pelos mais diferentes atores. Além das tradicionais forças de segurança e de governos e parlamentares, o autoritarismo da censura tem chegado a grandes empresas, direções de escolas até a cidadãos comuns, que tem feito uso do Poder Judiciário para calar aqueles de quem discordam. Assim, manifestações de intolerância religiosa, política e cultural, fruto do avanço conservador no país e de um discurso do ódio reproduzido muito tempo e de maneira sistemática pelos meios de comunicação hegemônicos, têm se espraiado.

Como lembra a apresentação do relatório, casos como o do jovem pernambucano Edvaldo Alves, morto em decorrência de um tiro de bala de borracha enquanto protestava justamente contra a violência, ou do estudante universitário Mateus Ferreira da Silva, que teve traumatismo craniano após ser atingido com um golpe na cabeça durante manifestação em Goiânia, deixaram de ser raridade. A publicação também traz o registro da invasão da Escola Florestan Fernandes, do MST, pela polícia; da condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães; e do flerte de Temer com a suspensão dos direitos constitucionais, por meio do decreto presidencial de 24 de maio passado, que declarou Estado de Defesa e autorizou a ação das Forças Armadas para garantir a “ordem” no país.

Na avaliação da Coordenação Executiva do FNDC, desde o lançamento da campanha Calar Jamais!, o que se registrou foi assustador. “Denúncias chegavam constantemente, e cada vez mais diversificadas. Não era apenas a quantidade de casos que alarmava, mas os diferentes tipos de violações, que se sucediam progressivamente, cada vez mais graves”, afirma a entidade em trecho de apresentação do relatório.

O mais preocupante é que os casos sistematizados pelo Fórum relatam apenas as denúncias que chegaram até à campanha, especialmente em decorrência da sua própria visibilidade na mídia e na internet. Pelo quadro apresentado, portanto, é razoável imaginar que dezenas de outros episódios certamente ocorreram e não alcançaram qualquer repercussão no país. Outros seguem em curso, como projetos de lei para proibir manifestações artísticas ou estudantes que ainda respondem a processos por terem ocupado escolas contra a PEC 55. Também segue o desmonte da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), onde os registros de assédio moral e censura contra jornalistas e radialistas, praticados pela direção nomeada por Temer, são quase diários. Tudo diante da omissão ou conivência de quem deveria defender a liberdade de expressão no país.

Além de cobrar publicamente a responsabilidade dos agentes internos responsáveis pelos ataques à liberdade de expressão constatadas, a campanha Calar Jamais! e o FNDC pretendem levar o relatório para autoridades nacionais e organismos internacionais de defesa de direitos humanos. E, assim, quem sabe, condenar o Estado brasileiro nas cortes internacionais por estas violações.

Comunicação e Direitos Humanos
Por Felipe Sakamoto – ABONG

Existem organizações da sociedade civil que atuam em diversos campos, como o movimento pela terra, o feminista, LGBT, pela educação, primeira infância e dentre outros. Dentro desse universo, encontram-se entidades que se dedicam inteiramente à luta para a democratização da comunicação, como o Intervozes e o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação.  Contudo, para a jornalista do Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF) Rosa Sampaio, independente do segmento, o direito à comunicação deve atravessar qualquer pauta dentro da defesa aos Direitos Humanos: “Se defendemos um país democrático, políticas públicas sociais e a efetivação dos direitos humanos, a nossa pauta também deve ser a democratização da comunicação”.

Renata Mielli, coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, lembra que os movimentos sociais e as organizações demoraram a entender a importância da comunicação para a conquista de direitos. Antes, o assunto era somente visto de maneira institucional, direcionada à divulgação das ações e instrumento de luta política. “Não é possível criar um projeto de inclusão social, de distribuição de renda, de enfrentamento de interesses mesmo que sejam pequenos no âmbito do capital, se você não alterar as estruturas de comunicação de uma sociedade”, defende.

O Coletivo de Cultura Luiz Freire, de Pernambuco, também concorda com esta visão ao atuar pela democratização dos meios de comunicação por meio da defesa dos direitos humanos e pela radicalização da democracia. Para Rosa Sampaio, a discussão sobre este tema se popularizou bastante nos últimos anos no Brasil, com a criação de congresso e da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e também com os incentivos à cultura promovidos pelo Ministério da Cultura.  Contudo, percebe um retrocesso após o golpe político no Brasil.

Segundo pesquisa feita pelo Instituto de Estudos e Pesquisa em Comunicação, em 2014, apenas seis grupos de comunicação detêm 667 veículos dentre rádios, jornais e emissoras de TV. Procurando engajar as organizações da sociedade civil e movimentos sociais no campo da comunicação, a Abong e suas associadas, CFEMEA, CESE e CAMP, no escopo do Projeto Sociedade Civil Construindo a Resistência Democrática, criaram a Rede de Comunicadores pela Defesa de Direitos com diversas OSCs com o objetivo de contrapor o monopólio das empresas corporativas.

O Grupo Facilitador da Rede irá engajar novas entidades por meio de oficinas sobre comunicação e campanhas, visando ampliar a visibilidade das organizações da sociedade civil que são invisibilizadas pelos grandes meios de comunicação.

“A importância de uma rede de comunicadores das organizações da sociedade civil como está sendo construída pela Abong é de se trabalhar em articulação. Isso fortalece a luta por direitos. Unimos pautas. Principalmente em um campo de defesa de direitos e dos movimentos sociais, onde nossa voz é muito calada ou quando falamos para nós mesmos”, afirma a jornalista, que acredita na potencialização dessas vozes ao trabalhar em rede.

Fonte: Escrito por: Redação FNDC
Baixe aqui o relatório “Calar Jamais! – Um ano de denúncias contra violações à liberdade de expressão”.