“Respeitar os direitos das comunidades ”. Essa foi uma das frases mais repetidas durante a “Audiência Pública sobre Violação aos Direitos Humanos de acesso a água e ao território dos povos tradicionais do oeste baiano”. A ação civil pública abriu a Missão Ecumênica pela Águas do Cerrado da Bahia: “Das nascentes ao São Francisco, águas para a vida! ”, iniciativa do Fórum Ecumênico ACT Brasil, sob coordenação da CESE, em parceria com diversas organizações populares, movimentos sociais e pastorais.
A audiência ocorreu na Câmara de Vereadores da cidade de Barreiras (BA) e reuniu diversas representações sociais, gerazeiros, quilombolas, ribeirinhos, camponeses e camponesas de comunidades do oeste da Bahia – povos tradicionais das bacias do Rio Grande e Rio Corrente, do Baixo Rio São Francisco e outras localidades. O objetivo da ação civil pública foi debater e ouvir as populações diretamente afetadas com a violações de direitos relacionados a água, a terra e ao território.
Com a atribuição de estimular a efetiva participação da sociedade civil nas discussões e ações voltadas a proteção da Bacia do Rio São Francisco, a audiência pública contou com a participação da Promotoria Regional de Barreiras e Promotoria de Justiça de Formosa do Rio Preto, a Coordenação do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos (CAODH), a CESE, o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), a Agência 10envolvimento, o Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Corrente, a Secretária de Promoção da Igualdade Racial (SEPROMI), a Governadoria do Estado da Bahia, o Ministério Público, entre outros.
Durante a audiência foram discutidas questões referentes ao atual modelo de desenvolvimento brasileiro e como o agronegócio tem usurpado os recursos naturais e destruído vidas. Amanda Silva, da Agência 10envolvimento, compôs a mesa como representante das organizações e movimentos presentes com o intuito de evidenciar os problemas sociais e ambientais que atingem as populações há décadas: “As comunidades lutam e resistem há anos para manter o Cerrado em pé. E isso tem aumentado os conflitos socioambientais e cerceado os direitos das comunidades. Não vamos pagar o preço desse modelo de desenvolvimento insustentável”, afirma a militante, sendo uma das falas mais aplaudidas pelas duzentas pessoas presentes no ato.
A plenária participou ativamente desta ação da Missão Ecumênica. Foram inúmeros os relatos de violência policial, ameaças, cárcere privado e sequestro de liderança. Na comunidade de Aldeia, no município de Formosa do Rio Preto são muitos os depoimentos de violação de direitos, que vão desde o risco a integridade física à falta de sossego emocional. Os moradores relataram agressões e atrocidades, além de denunciar a omissão e anuência do Estado. “O progresso chegou como rolo compressor passando por cima da gente. Estamos sendo oprimidos. Somos cidadãos com direitos e esses direitos precisam ser respeitados. ”, afirmou uma das participantes.
A plenária também se posicionou em relação ao Estado, que não só financia agronegócio, como também se omite diante dos conflitos socioambientais existentes na região. “Ninguém diz que as terras utilizadas para o agronegócio são terras públicas griladas. Há financiamento público através paras Parcerias Público Privadas (PPP) para explorar e violar direitos. Sem falar nas violentas ações e pistolagens legitimadas por decisões políticas e por fraudes cartoriais. ”, narrou um dos debatedores da plenária.
Luciana Khoury, promotora ambiental do Ministério Público da Bahia e mediadora da audiência, chama atenção para a questão da concentração da riqueza e da desigualdade condições socioeconômicas da região. Para a promotora, muitas comunidades produtivas são responsáveis pelo desenvolvimento do país e que decisões sobre a exploração dos recursos naturais precisam ser compartilhadas com a população: “As comunidades precisam ser consultadas. Se há indícios de devolutividade, não pode ter outorga e supressão de vegetal. É por isso que as pessoas estão afirmando que há ilegalidade. ”.
Para Khoury o saldo da audiência foi bastante positivo: “Quando as situações são contextualizadas sabemos quais serão os limites para exploração dos recursos naturais e quais serão os critérios técnicos paras concessões. Conseguimos coletivamente identificar onde podemos melhorar. ”, concluiu a mediadora.
Além da Missão Ecumênica, audiência pública fez parte do encerramento da missão organizada pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e pelo Comitê de Defensores/as de Direitos Humanos (CBDDH).
Fotos: Thomas Bauer